terça-feira, 30 de junho de 2015

O Retorno de Paulo à Antioquia

Após uma jornada que se estendeu em um espaço de três ou quatro anos, nosso apóstolo retorna à Antioquia. Ele tinha viajado um longo circuito, e disseminado o cristianismo em muitas cidades prósperas e populosas, quase que inteiramente por seus próprios esforços. Se o leitor deseja manter interesse na história de Paulo, deve notar clara e distintamente as grandes épocas na vida de Paulo, e os principais pontos em suas diferentes jornadas. Mas antes de começar com Paulo em sua terceira jornada missionária, pode ser interessante tomar nota de um outro grande pregador do evangelho que aparece exatamente neste momento, e cujo nome, ao lado do apóstolo, é talvez o mais importante na história do início da igreja (N. do T., tirando o nome do próprio Senhor).

Apolo era um judeu de nascença, natural da Alexandria. Ele era um "homem eloquente e poderoso nas Escrituras ... conhecendo somente o batismo de João" (Atos 18:24,25). Ele era devoto, sincero e reto, publicamente confessando e pregando aquilo que conhecia, e o poder do Espírito Santo era manifesto nele. Não parece que ele tenha recebido qualquer designação, ordenação ou sanção de qualquer tipo, nem dos doze nem de Paulo. Mas o Senhor, que está acima de todos, o chamou, e estava agindo nele e por ele. Vemos assim, no caso de Apolo, a manifestação do poder e liberdade do Espírito Santo, sem a intervenção humana. É interessante observar isto. A ideia de um clericalismo exclusivo é a negação prática da liberdade do Espírito em agir por quem Ele quer. Mas embora ardente em zelo e um locutor poderoso, Apolo conhecia apenas o que João (o batista) tinha ensinado a seus discípulos. O Senhor sabia disto, e proveu mestres para ele. Dentre aqueles que ouviam a seus fervorosos apelos, dois dos bem instruídos discípulos de Paulo foram conduzidos a tomar um interesse especial por ele. E embora ela fosse ensinado e eloquente, ele era humilde o bastante para ser instruído por Áquila e Priscila. Eles o convidaram à sua casa e, sem dúvida, em espírito humilde, "lhe declararam mais precisamente o caminho de Deus" (Atos 18:26). Que simples! Que natural! E que belo! Tudo é do Senhor. Ele ordenou que Áquila e Priscila fossem deixados em Éfeso - que Apolo deveria vir e animar o povo em Éfeso antes da chegada de Paulo; e, após ser instruído, que deveria ir a Corinto e ajudar na boa obra naquele lugar, obra esta iniciada por Paulo. Apolo regou o que Paulo tinha plantado, e Deus deu um aumento abundante. Tais são os benditos caminhos do Senhor em Seu pensativo amor e carinhoso cuidado por Seus servos, e por todas as Suas assembleias.

sábado, 20 de junho de 2015

A Quarta Visita de Paulo a Jerusalém

Não nos são fornecidas quaisquer informações, pelos historiadores sagrados, sobre o que ocorreu em Jerusalém naquela ocasião. Apenas nos é dito que Paulo "subiu a Jerusalém e, saudando a igreja, desceu a Antioquia." (Atos 18:22). Mas seu intenso desejo de fazer esta visita pode nos assegurar sua grande importância. Ele pode ter sentido que  tinha chegado a hora quando os judeus cristãos, reunidos na festa, deveriam ouvir um relato completo da recepção do evangelho entre os gentios. Colônias romanas e capitais gregas tinham sido visitadas, e uma grande obra de Deus tinha sido cumprida. Tudo isto teria sido perfeitamente natural e correto, mas desejamos não remover o véu que o Espírito Santo colocou sobre essa visita.

Paulo desce de Jerusalém à Antioquia, visitando todas as assembleias que ele tinha inicialmente formado; e assim, de certo modo, unindo sua obra: Antioquia e Jerusalém. Até onde sabemos, foi a última visita de Paulo à Antioquia. Já vimos como novos centros de vida cristã tinham sido estabelecidos por ele nas cidades gregas do Egeu. O curso do evangelho segue cada vez mais para o Ocidente, e a parte inspirada da biografia do apóstolo, após um curto período de profundo interesse na Judeia, finalmente se centraliza em Roma.

A Rápida Visita de Paulo a Éfeso

O momento chegou em que Paulo achou por bem deixar Corinto e revisitar Jerusalém. Ele tinha um grande desejo de estar na próxima festa. Mas antes de partir, recebeu uma solene despedida da jovem assembleia, prometendo (o Senhor permitindo) retornar.

Acompanhado de Áquila e Priscila, ele deixa Corinto em paz. Mas quando no porto, antes da partida, aconteceu uma cerimônia que levantou não pouca discussão. Paulo, estando sob um voto, raspa sua cabeça em Cencreia. Em sua própria mente, e como um que era guiado pelo Espírito, temos certeza de que ele estava muita acima e além de uma religião de festas e votos, mas mesmo assim, inclinou-se, em graça, aos costumes de sua nação. Aos judeus ele se torna um judeu. A constante oposição dos judeus à sua doutrina e a violenta perseguição nunca enfraqueceram as afeições do apóstolo para com seu amado povo: certamente tal proceder vinha de Deus. Enquanto ele procurava, na energia do Espírito, pregar o evangelho aos gentios, ele nunca esquecia, em fidelidade à palavra de Deus, de pregar aos judeus primeiro. Assim ele é para nós como a viva expressão da graça de Deus para com os gentios, e de suas remanescentes afeições para com os judeus.

A equipe missionária chega a Éfeso. Paulo vai à sinagoga e debate com os judeus. Eles parecem inclinados a ouvi-lo, mas ele tem um forte desejo de subir a Jerusalém e celebrar a festa que se aproxima. Assim ele "se despediu deles, dizendo: É-me de todo preciso celebrar a solenidade que vem em Jerusalém; mas querendo Deus, outra vez voltarei a vós. E partiu de Éfeso." (Atos 18:21)

sábado, 13 de junho de 2015

A Visita de Paulo a Corinto

A conexão de Corinto com a história, com os ensinos e com os escritos de nosso apóstolo é quase tão íntima e importante quanto Jerusalém ou Antioquia. Corinto pode ser considerada seu centro na Europa. Aqui Deus teve "muito povo" (Atos 18:10), e aqui Paulo "ficou um ano e seis meses, ensinando entre eles a palavra de Deus." (Atos 18:11). Foi também em Corinto que ele escreveu suas duas primeiras cartas apostólicas - as duas Epístolas aos Tessalonicenses.

Corinto, a capital romana da Grécia, era uma grande cidade mercantil, em conexão imediata com Roma e com o oeste do Mediterrâneo, com Tessalônica e Éfeso no Mar Egeu, e com a Antioquia e Alexandria a leste. Assim, por meio de seus dois notáveis portos, a cidade recebia embarcações tanto dos mares ocidentais quanto dos mares orientais. *

{* Para detalhes geográficos mais completos e detalhados, veja A Vida e as Epístolas de São Paulo, de Conybeare e Howson. Também acrescentamos que essa é nossa principal fonte no que diz respeito às datas. É provavelmente o melhor e mais abrangente livro sobre a história do grande Apóstolo, com exceção das próprias Escrituras}

Paulo parece ter viajado sozinho a Corinto. Se Timóteo foi ter com ele quando em Atenas (1 Tessalonicenses 3:1), ele foi enviado de volta a Tessalônica, lugar pelo qual, como veremos em breve, Paulo tinha grande afeição no coração. Logo após sua chegada ele inesperadamente encontrou dois amigos e companheiros na obra: Áquila e sua esposa Priscila. Nesta época em particular deveria haver um número maior de judeus em Corinto do que o normal, "pois Cláudio tinha mandado que todos os judeus saíssem de Roma." (Atos 18:2) O Senhor usou, assim, o banimento de Áquila e Priscila para fornecer um lugar para Seu solitário servo ficar. Eles eram da sua terra (Israel), do seu mesmo ramo de negócio, e do mesmo coração e espírito. "E, como era do mesmo ofício, ficou com eles, e trabalhava; pois tinham por ofício fazer tendas." (Atos 18:3)

Quão graciosos e maravilhosos são os caminhos do Senhor para Seu servo. Em uma cidade de riqueza e comércio cercada de gregos nativos, colonos romanos, e judeus vindos de todos os cantos, ele trabalha silenciosamente em seu próprio comércio de modo a não ser um incômodo para nenhum deles. Aqui temos, de certo modo, um exemplo da mais profunda e elevada espiritualidade combinada com o trabalho diligente nas coisas comuns desta vida. Que exemplo! E que lição! Sua labuta diária não gerava impedimento à sua comunhão com Deus. Nunca ninguém conheceu tão bem, ou sentiu tão profundamente, o valor do evangelho que ele carregava consigo: as questões da vida e da morte estavam ligadas a isso, e mesmo assim ele podia se entregar ao trabalho comum. Mas isto ele fez, assim como a pregação, para o Senhor e para Seus santos. Ele frequentemente se refere a isto em suas Epístolas, e fala disso como um de seus privilégios: "E em tudo me guardei de vos ser pesado, e ainda me guardarei. Como a verdade de Cristo está em mim, esta glória não me será impedida nas regiões da Acaia." (2 Coríntios 11:9,10 *)

{* Como alguns têm supervalorizado essa passagem, e outros a têm subestimado, pode ser interessante observar o que cremos ser seu verdadeiro significado. A decisão do apóstolo de não ser pesado aos santos, como aqui tão fortemente expressa, se aplica principalmente, se não exclusivamente, à igreja de Corinto. Um importante princípio estava envolvido, mas foi um princípio de particular aplicação ao caso, e não geral. Ele reconhece as dádivas das outras igrejas da maneira mais grata possível (Filipenses 4) e, ao escrever aos coríntios mais tarde, ele diz: "Outras igrejas despojei eu para vos servir, recebendo delas salário; e quando estava presente convosco, e tinha necessidade, a ninguém fui pesado. Porque os irmãos que vieram da macedônia supriram a minha necessidade" (2 Coríntios 11:8,9). O apóstolo, sem dúvida, tinha a melhor das razões para recusar, dessa maneira, a comunhão com a igreja em Corinto. Sabemos que havia "falsos apóstolos" e muitos inimigos lá, e que muitas perturbações graves e sérias tinham sido permitidas entre eles, as quais ele fortemente repreendeu e procurou corrigir. Sob tais circunstâncias, para que seus motivos não fossem mal interpretados, o apóstolo preferiu trabalhar com suas próprias mãos do que receber apoio da igreja em Corinto. E, "Por quê?", ele pergunta, "Porque não vos amo? Deus o sabe. Mas o que eu faço o farei, para cortar ocasião aos que buscam ocasião, a fim de que, naquilo em que se gloriam, sejam achados assim como nós” (2 Coríntios 11:11-12). }

Há outra coisa relacionada a esta característica do percurso do apóstolo que é de grande interesse. Acredita-se, em geral, que ele tenha escrito suas duas epístolas aos tessalonicenses mais ou menos nessa época, e alguns pensam que também a Epístola aos Gálatas. Estas permanecem diante de nós como verdadeiras testemunhas de sua proximidade com Deus e sua comunhão com Ele, enquanto se mantinha com o trabalho de suas próprias mãos. Mas quando chega o sábado de descanso, a oficina é fechada, e Paulo vai à sinagoga. Este era seu hábito. "E todos os sábados disputava na sinagoga, e convencia a judeus e gregos" (Atos 18:4). Mas enquanto Paulo estava ocupado, tanto nos dias de semana quanto nos sábados, Silas e Timóteo chegaram da Macedônia. É evidente que eles trouxeram consigo alguma ajuda que iria ajudar a suprir as necessidades do apóstolo naquele tempo, e assim aliviá-lo de tal trabalho constante.

A chegada de Silas e Timóteo parece ter encorajado e fortalecido o apóstolo. Seu zelo e energia no evangelho são evidentemente fortalecidos. Ele "foi impulsionado no espírito, testificando aos judeus que Jesus era o Cristo." (Atos 18:5), mas eles se opuseram à sua doutrina e blasfemaram. Isto levou Paulo a tomar seu curso com grande ousadia e decisão. Ele sacode a roupa, como sinal de estar limpo do sangue deles, e declara que dali em diante passará a tratar com os gentios. Em tudo isto ele foi conduzido por Deus, e agiu de acordo com Sua mente. Enquanto era possível, ele pregava na sinagoga; mas quando ele não mais podia estar lá, foi compelido a usar o lugar mais conveniente que ele podia encontrar. Em Éfeso, ele pregou na escola de um tal de Tirano; em Roma, ele "ficou dois anos inteiros na sua própria habitação que alugara, e recebia todos quantos vinham vê-lo;" (Atos 28:30); e aqui, em Corinto, um prosélito chamado Justo abriu sua casa ao rejeitado apóstolo.

Nessa particular crise na história do apóstolo ele foi favorecido com outra revelação especial do próprio Senhor. "E disse o Senhor em visão a Paulo: Não temas, mas fala, e não te cales; porque eu sou contigo, e ninguém lançará mão de ti para te fazer mal, pois tenho muito povo nesta cidade. E ficou ali um ano e seis meses, ensinando entre eles a palavra de Deus." (Atos 18:9-11). Porém, novamente, seus implacáveis inimigos se enfurecem. O grande sucesso do evangelho entre os pagãos excitou a raiva dos judeus contra Paulo, que procuraram usar a vinda de Gálio, um novo governador, para realizar suas más intenções.

Gálio foi o irmão de Sêneca, o filósofo, e, como tal, era muito bem instruído. Ele era sábio, justo e tolerante como governador, embora desdenhoso em seu tratamento com as coisas sagradas. Mas o Senhor, que estava com Seu servo como Ele mesmo tinha dito, usou a incrédula indiferença de Gálio para derrotar os maliciosos desígnios dos judeus, e para virar suas falsas acusações contra eles mesmos. Como estavam frustrados em seus propósitos malignos, o apóstolo tinha maior liberdade e menos aborrecimento ao levar em frente a obra do evangelho. Seus benditos frutos logo se manifestaram por toda a província da Acaia (1 Tessalonicenses 1:8,9)

domingo, 22 de março de 2015

A Visita de Paulo a Atenas

A aparição do apóstolo em Atenas é um evento de grande importância em sua história. Atenas era, em certos aspectos, a capital do mundo, e a sede da cultura e filosofia grega; mas era também o ponto central da superstição e idolatria.

É muito interessante observar que o apóstolo não tinha pressa de começar seu trabalho nesse lugar. Ele concedeu tempo à reflexão. Pensamentos profundos, e o pesar de tudo na presença de Deus e à luz da morte e ressurreição de Cristo, encheram sua mente. Sua primeira intenção era esperar pela chegada de Silas e Timóteo. Ele tinha enviado uma mensagem para Bereia para que eles fossem ter com ele o mais rápido possível. Mas quando ele se viu rodeado de templos, e altares, e estátuas, e adoração idólatra, ele não podia mais ficar em silêncio. Como de costume, ele começa com os judeus, mas também disputa diariamente com os filósofos no mercado: cristianismo e paganismo então se confrontam abertamente entre si; e, vale observar, o apóstolo do cristianismo estava sozinho em Atenas, enquanto o lugar fervilhava de apóstolos do paganismo; e tão numerosos eram os objetos de adoração, que um satirista uma vez observou: "É mais fácil encontrar um deus que um homem em Atenas".

Alguns, com desprezo, ridicularizavam o que ouviam, e outros ouviam e desejavam ouvir mais. "E alguns dos filósofos epicureus e estóicos contendiam com ele; e uns diziam: Que quer dizer este paroleiro? E outros: Parece que é pregador de deuses estranhos; porque lhes anunciava a Jesus e a ressurreição." (Atos 17:18). Estas palavras tinham causado grande impressão, e permaneceram claramente em suas mentes. Que novidade, e que bendita realidade para as almas! A Pessoa de Cristo; não uma teoria: o fato da ressurreição; não uma sombria incerteza quanto ao futuro. O ministro de Cristo desnuda aos estudados atenienses a temerosa condição em que se encontravam sob a visão do verdadeiro Deus. No entanto, eles desejavam uma exposição mais plena e mais deliberada sobre esses misteriosos assuntos, e levaram Paulo ao Areópago. 

Desse lugar, o Areópago, é dito que era o mais conveniente e apropriado para um discurso. A mais solene corte da justiça havia sentado desde tempos imemoriais na colina do Areópago. Os juízes se sentavam ao ar livre sobre assentos escavados na rocha. Nesse local, muitas questões solenes tinham sido discutidas, e muitos casos solenes decididos: começando com o lendário julgamento de Marte, o que deu ao lugar o nome de "colina de Marte".

Foi nesse cenário que Paulo dirigiu-se à multidão. Não há um momento sequer na história do apóstolo, ou na história do começo do cristianismo, mais profundamente interessante ou mais conhecido que este. Inspirado por sentimentos para a honra de Deus, e cheio do conhecimento sobre a condição do homem à luz da cruz, o que deve ter ele sentido enquanto estava na colina de Marte? Para onde quer que voltasse os olhos, os sinais da idolatria em suas milhares de formas se levantavam diante dele. Ele poderia ter sido traído, diante das circunstâncias, a falar com exagerada ousadia; mas ele dominou seus sentimentos, e absteve-se de uma linguagem intemperada. Considerando a fervência de seu espírito, e a grandeza de seu zelo pela verdade, foi um notável exemplo de auto-negação e auto-controle. Mas seu Senhor e Mestre estava com ele, embora para o olho humano ele estivesse sozinho diante dos atenienses e dos muitos estrangeiros que se reuniam naquela universidade do mundo.

Pela sabedoria, prudência, raciocínio claro e perfeita habilidade, o discurso de Paulo se destaca nos anais da história da humanidade. Ele não começou atacando seus falsos deuses, ou denunciando a religião deles como uma ilusão satânica e objeto de seu ódio absoluto. O zelo sem conhecimento teria feito assim, e teria ficado satisfeito com sua própria fidelidade. Mas no discurso que temos diante de nós temos um exemplo da melhor maneira de se aproximar das mentes e corações de pessoas ignorantes e preconceituosas de qualquer idade. Que o Senhor possa dar sabedoria a todos Seus servos para seguir este exemplo!

Suas palavras de abertura são, ao mesmo tempo, vencedoras e reprobatórias: "Homens atenienses, em tudo vos vejo um tanto supersticiosos." (Atos 17:22). Ele, então, começa reconhecendo que eles tinham sentimentos religiosos, mas que estavam na direção errada; e então fala de si como sendo um que estava disposto a conduzi-los ao conhecimento do verdadeiro Deus: "Esse, pois, que vós honrais, não o conhecendo, é o que eu vos anuncio." (Atos 17:23). Ele sabiamente seleciona, para seu texto, a inscrição: "AO DEUS DESCONHECIDO" (Atos 17:23). Isto lhe dá a oportunidade de começar do mais baixo degrau da escada da verdade. Ele fala da unicidade de Deus, o Criador, e da relação do homem com Ele. Mas ele logo deixa o argumento contra a idolatria e procede pregando o evangelho. E ainda assim ele tem o cuidado de não introduzir o nome de Jesus em seu discurso público. Ele tinha tinha feito isso totalmente em suas ministrações mais particulares: mas, estando cercado pelos discípulos e admiradores de nomes como Sócrates, Platão, Zeno e Epícuro, ele sagradamente guarda o santo nome de Jesus do risco de uma comparação com tais. Ele bem sabia que o nome do humilde Jesus de Nazaré era "loucura (bobagem) para os gregos" (1 Coríntios 1:23). No entanto, é fácil observar que, próximo ao fim de seu discurso, a atenção de toda a audiência está concentrada no homem Cristo Jesus, embora Seu nome não seja mencionado em todo o discurso. Então ele procede: "Mas Deus, não tendo em conta os tempos da ignorância, anuncia agora a todos os homens, e em todo o lugar, que se arrependam; porquanto tem determinado um dia em que com justiça há de julgar o mundo, por meio do homem que destinou; e disso deu certeza a todos, ressuscitando-o dentre os mortos." (Atos 17:30-31). Aqui a paciência de sua audiência acabou - seu discurso foi interrompido. Mas a última impressão deixada em suas mentes era de eterno peso e importância. O apóstolo inspirado se dirigiu às consciências, e não à curiosidade intelectual dos filósofos. A menção da ressurreição dos mortos e do julgamento do mundo, com tal poder e autoridade, não podia deixar de perturbar aqueles orgulhosos e auto-indulgentes homens. O princípio essencial, ou o maior objetivo, do filósofo epicureu, era satisfazer a si mesmo; o do estoico era uma orgulhosa indiferença ao bem e ao mal, ao prazer e a dor.

Que dúvidas podemos ter de que essa notável assembleia se desfaria em meio ao escárnio desdenhoso de alguns e à gélida indiferença de outros? Mas, apesar de tudo, o cristianismo tinha ganhado sua primeira e nobre vitória sobre a idolatria e, quaisquer que tenham sido os resultados imediatos do discurso de Paulo, sabemos que tem sido de bênção para muitos desde então, e que ainda trará muitos frutos em muitas almas, e continuará a dar frutos para a glória de Deus sempre e sempre.

Paulo agora se afasta do meio deles. Ele não parece ter sido expulso por qualquer tumulto ou perseguição. O bendito Senhor lhe concedeu provar de Sua própria alegria e da alegria dos anjos quando alguns pecadores contritos o buscaram: "entre os quais foi Dionísio, areopagita, uma mulher por nome Dâmaris, e com eles outros." (Atos 17:34). Mas na cidade militar de Filipos, e nas cidades mercantis de Tessalônica e Corinto, o número de conversões parece ter sido muito maior do que na altamente educada e civilizada cidade de Atenas. Isto é profundamente humilhante para o orgulho do homem, e para os vangloriosos poderes da mente humana. Uma Epístola foi escrita aos filipenses, duas aos tessalonicenses, e duas aos coríntios: mas não temos nenhuma carta escrita por Paulo aos atenienses, e não lemos de ter ele outra vez visitado Atenas.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Paulo em Tessalônica e Bereia

Paulo e Silas agora dirigem seu percurso até Tessalônica. Timóteo e Lucas parecem ter ficado para trás em Filipos por um tempo. Tendo passado através de Anfípolis e Apolônia, Paulo e Silas chegam a Tessalônica. Ali eles encontram uma sinagoga. Era uma cidade comercial de grande importância, onde muitos judeus residiam. "Paulo, como tinha por costume, foi ter com eles; e por três sábados disputou com eles sobre as Escrituras." (Atos 17:2). Os corações de muitos foram tocados por suas pregações, e uma grande multidão de devotos gregos e mulheres da alta sociedade creram. Mas o velho inimigo de Paulo aparece novamente. "Os judeus desobedientes, movidos de inveja, tomaram consigo alguns homens perversos, dentre os vadios e, ajuntando o povo, alvoroçaram a cidade, e assaltando a casa de Jasom, procuravam trazê-los para junto do povo. E, não os achando, trouxeram Jasom e alguns irmãos à presença dos magistrados da cidade, clamando: Estes que têm alvoroçado o mundo, chegaram também aqui; os quais Jasom recolheu; e todos estes procedem contra os decretos de César, dizendo que há outro rei, Jesus." (Atos 17:5-7). Estes versículos devem bastar para nos dar uma ideia do caráter universal dos judeus contra o evangelho e contra Paulo, seu principal ministro.

O apóstolo tinha, evidentemente, pregado aos tessalonicenses a verdade a respeito da exaltação de Cristo e Sua vinda na glória: "Dizendo que há outro rei, Jesus." Daí a constante alusão à vinda do Senhor, e ao "dia do Senhor", nas Epístolas de Paulo àquela igreja. Pelo que diz Paulo em sua primeira Epístola, aprendemos que seus trabalhos foram muito abundantes e grandemente reconhecidos e abençoados pelo Senhor para muitas almas. (1 Tessalonicenses 1:9-10; 2:10-11)

O apóstolo agora procede para a Bereia. Ali os judeus eram mais nobres. Eles examinavam o que ouviam pela Palavra de Deus. Houve uma grande bênção ali também. Muitos creram, mas os judeus, como caçadores após sua presa, apressaram-se de Tessalônica para a Bereia, e levantaram um tumulto que forçou Paulo a deixar o lugar quase imediatamente. Acompanhado por alguns dos bereianos convertidos, ele direcionou seu curso para Atenas. Silas e Timóteo ficaram para trás.

domingo, 15 de fevereiro de 2015

O Efeito da Pregação de Paulo em Filipos

A quantidade de judeus em Filipos aparentemente era pequena, já que não havia sinagoga no lugar. Mas o apóstolo, como de costume, vai a eles primeiro, mesmo quando se trata de umas poucas mulheres reunidas à margem do rio (Atos 16). Paulo prega a elas, Lídia é convertida, a porta é aberta, e outras também creem. Foi nesse lugar despretensioso, e àquelas poucas mulheres piedosas, que o evangelho foi pregado pela primeira vez na Europa, e onde a primeira casa foi batizada*. Mas o silencioso início e seus triunfos pacíficos logo foram perturbados pela malícia de Satanás e pela cobiça do homem. O evangelho não avançaria em meio ao paganismo com facilidade e conforto, mas com grande oposição e sofrimento.

{* A ação do Espírito quanto à família parece ter sido marcante entre os gentios; entre os judeus, até onde sabemos, não ouvimos falar disso. Encontramos, também, distritos entre os judeus, e também entre os samaritanos, que foram poderosamente impressionados (para dizer o mínimo) pelo evangelho. Mas entre os gentios, famílias parecem ter sido particularmente visitadas pela graça divina, como registrado pelo Espírito. Tome por exemplo Cornélio, o carcereiro e Estéfanas; de fato, encontramos isso vez após vez. Isto é extremamente encorajador - especialmente para nós. - Extraído de Leituras Introdutórias dos Atos dos Apóstolos, etc., por W. Kelly}

Enquanto o apóstolo e seus companheiros iam ao oratório, ou lugar de oração, uma jovem possuída por um espírito maligno os seguia, e clamava, dizendo: "Estes homens, que nos anunciam o caminho da salvação, são servos do Deus Altíssimo." (Atos 16:17). Da primeira vez, Paulo não deu atenção. Ele foi em frente com sua própria bendita obra de pregação de Cristo, e de ganhar almas para Ele. Mas a pobre e obsessiva escrava persistia em segui-los, e em proferir a mesma exclamação. Foi uma tentativa maliciosa do inimigo para impedir a obra de Deus ao prestar um testemunho aos ministros da Palavra. Deve ser observado que ela não presta testemunho a "Jesus", ou ao "Senhor", mas aos Seus "servos", e ao "Deus Altíssimo". Mas Paulo não queria um testemunho para ele mesmo, nem um testemunho vindo de um espírito maligno, e ele, "perturbado, voltou-se e disse ao espírito: Em nome de Jesus Cristo, te mando que saias dela. E na mesma hora saiu." (Atos 16:18)

Como a moça não podia mais praticar suas artes de adivinhação, seus mestres viram-se privados dos ganhos que eles tinham derivado daquela fonte. Enfurecidos pela perda de sua propriedade, e movendo as multidões ao seu favor, prenderam Paulo e Silas e os arrastaram perante os magistrados. Como eles estavam bem conscientes de que não tinham nenhuma acusação verdadeira para trazê-los perante eles, levantaram o velho clamor da "perturbação da paz" - de que eles estavam tentando introduzir práticas judaicas na colônia romana, e ensinar costumes que eram contrários às leis romanas. E, como tem sido muitas vezes, o clamor da multidão foi aceito no lugar da evidência, exame e deliberação. Os magistrados, sem perguntar mais nada, ordenou-lhes que fossem açoitados e lançados na prisão. E assim foi, aqueles benditos servos de Deus, feridos, sangrando e fracos foram entregues a um cruel carcereiro, que aumentou ainda mais o sofrimento deles ao prender-lhes os pés no tronco. Mas Paulo e Silas, em vez de ficarem deprimidos por seus sofrimentos no corpo e pelas sombrias paredes da prisão, alegraram-se por terem sido considerados dignos de sofrer vergonha e dor por causa de Cristo; e em vez do silêncio da meia-noite ser quebrado com os suspiros e gemidos dos prisioneiros, eles "oravam e cantavam hinos a Deus, e os outros presos os escutavam." (Atos 16:25)

Se a Satanás não lhe falta recursos para continuar sua obra ruim, a Deus não Lhe falta recursos para continuar Sua boa obra. Ele agora faz uso de tudo que aconteceu para direcionar o progresso da obra do evangelho, e para cumprir os propósitos do Seu amor. O carcereiro deve ser convertido, a igreja deve ser reunida, e um testemunho criado para o Senhor Jesus Cristo na própria fortaleza do paganismo. À meia-noite, enquanto Paulo e Silas estavam cantando e os prisioneiros estavam ouvindo ao som incomum, ocorre um grande terremoto. Deus entra em cena em majestade e graça. Ele levanta Sua voz e a terra treme: as paredes da prisão são chacoalhadas, as portas se abrem, e os grilhões de todo homem caem. E agora, o que são cadeias e prisões? O que são legiões romanas? O que é todo o poder do inimigo? A voz de Deus é ouvida na tempestade: mas a violência da tempestade é sucedida pela voz mansa e delicada do evangelho e da paz do Céu.

Logo despertado pelo terremoto, os primeiros pensamentos do carcereiro foram em relação a seus prisioneiros. Alarmado por ver as portas da prisão abertas, e supondo que os presos tinham fugido, ele pega sua espada para se matar. "Mas Paulo clamou com grande voz, dizendo: Não te faças nenhum mal, que todos aqui estamos." (Atos 16:28). Estas palavras de amor quebraram o coração do carcereiro. A calma serenidade de Paulo e Silas - sua recusa em valer-se da oportunidade de escapar - sua carinhosa preocupação para com ele - tudo combinado para fazê-los aparecer aos olhos do espantado carcereiro como seres de uma ordem superior. Ele deixou de lado sua espada, pediu por luz, saltou para dentro da prisão e, tremendo, caiu aos pés do apóstolo. Sua consciência foi, agora, alcançada, seu coração foi quebrantado, e havia algo como a violência de um terremoto agitando toda sua alma. Ele toma o lugar de um pecador perdido, e clama: "Senhores, que é necessário que eu faça para me salvar?" (Atos 16:30). Ele não fala como o doutor da lei em Lucas 10:25: "Mestre, que farei para herdar a vida eterna?" O que estava em questão para o carcereiro não era sobre fazer algo para a vida, mas sobre a salvação para o perdido. O doutor da lei, como muitos outros, não conhecia a si mesmo como um pecador perdido, portanto ele não fala sobre salvação.

Em resposta à mais importante pergunta que os lábios humanos podem fazer, "O que devo fazer para ser salvo?", o apóstolo direciona a mente do carcereiro para Cristo - "Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo, tu e a tua casa." (Atos 16:31). Deus deu a bênção, e toda sua família creu, se alegrou, e foi batizada. E agora tudo está mudado: o carcereiro leva os prisioneiros à sua própria casa - sua crueldade é transformada em amor, simpatia e hospitalidade. Na mesma hora da noite, lavou-lhes os vergões - lhes ofereceu comida - regozijou-se, crendo em Deus com toda sua casa. Que noite agitada! Que mudança em poucas horas! E que manhã alegre clareou sobre aquela feliz casa! O Senhor seja louvado!

Como o rei Dário, os magistrados parecem ter sido perturbados durante a noite. A notícia do terremoto, ou de que Paulo e Silas eram cidadãos romanos, parece tê-los alcançado. Mas assim que amanheceu, mandaram dizer ao carcereiro que "soltassem aqueles homens". Ele, imediatamente, fez conhecer a ordem a Paulo e Silas, e desejou-lhes que partissem em paz. Mas Paulo se recusou a aceitar sua liberdade sem algum reconhecimento público do erro de que haviam sido vítimas. Ele agora também torna conhecido o fato de que ele e Silas eram cidadãos romanos. As famosas palavras de Cícero tinham se tornado um provérbio, e tinham um imenso peso onde quer que fosse: "Acorrentar um cidadão romano é um ultraje, açoitá-lo é um crime". Os magistrados tinham, evidentemente, violado as leis romanas; mas Paulo só exigiu que, como eles tinham sido publicamente tratados como culpados, os magistrados fossem a público e declarassem que eram inocentes. Isto eles fizeram prontamente, vendo o erro que tinham cometido. "E, vindo, lhes dirigiram súplicas; e, tirando-os para fora, lhes pediram que saíssem da cidade. E, saindo da prisão, entraram em casa de Lídia e, vendo os irmãos, os confortaram, e depois partiram." (Atos 16:39-40) *

{* Veja os artigos evangelísticos sobre as principais personagens deste capítulo em Things New and Old, vol. 12, páginas 29-97.}


Antes de deixarmos este memorável capítulo, devemos apenas acrescentar algo que é muito agradável de se encontrar: na Epístola de Paulo aos Filipenses, as provas de um vínculo que os unia, e que continuou desde "o primeiro dia" até mesmo depois do aprisionamento de Paulo em Roma. Sua afeição pelos amados filipenses era maravilhosa. Ele se dirigiu a eles como "meus amados e mui queridos irmãos, minha alegria e coroa, estai assim firmes no Senhor, amados." (Filipenses 4:1). E ele reconhece, sem poder conter a alegria, sua comunhão incansável com eles no evangelho, e as muitas provas práticas do amável cuidado e carinhosa simpatia que eles tinham por ele. Já em sua residência em Tessalônica eles se lembravam das necessidades do apóstolo. "Porque também uma e outra vez me mandastes o necessário a Tessalônica." (Filipenses 4:16)

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