domingo, 11 de dezembro de 2016

A Disseminação do Cristianismo na Europa

Capítulo 14: Europa (372 d.C. - 814 d.C.)


O sistema eclesiástico que os monges italianos introduziram na Inglaterra rapidamente se disseminou, e finalmente triunfou. Em cerca de 100 anos após a chegada de Agostinho [de Cantuária], esse sistema era professado e crido por toda a Britânia anglo-saxônica. A igreja inglesa, assim fundada sobre o modelo romano, não podia falhar em manter uma posição especialmente dependente de Roma. Esta união em um período inicial foi promovida e fortalecida pelos monges, freiras, bispos, nobres e príncipes ingleses, que faziam frequentes peregrinações ao túmulo de São Pedro em Roma. O clero britânico, embora ainda aderente aos antigos modos, e dispostos a resistir à presunção estrangeira, foram obrigados a isolarem-se nas extremidades do país. O romanismo agora prevalecia sobre toda a Inglaterra.

A Escócia e a Irlanda parecem ter sido abençoadas com o cristianismo por volta da mesma época que a Britânia. Por meio de soldados, marinheiros, missionários e cristãos perseguidos vindos do sul, o evangelho foi pregado e muitos creram. No entanto, o início da história religiosa desses países é coberto de lendas, portanto vamos nos referir apenas aos nomes e eventos que possuem boa autenticidade.

domingo, 4 de dezembro de 2016

A Superstição e a Idolatria de Gregório

Ambição misturada com humildade e superstição misturada com fé caracterizavam o grande pontífice. Esta estranha mistura e confusão era, sem dúvida, o resultado de sua falsa posição. É difícil entender como um homem de tão bom senso pôde se tornar tão degradado pela superstição a ponto de acreditar na operação de milagres por meio de relíquias, e recorrer a tais coisas para a confirmação da verdade das Escrituras. Mas a triste verdade é que, em vez de devotar-se aos interesses de Cristo, ele foi cegado pelo grande e absorvente objetivo: os interesses da igreja de Roma. Paulo podia dizer: "Uma coisa faço"; e também "Uma coisa sei". Primeiro, devemos saber que somos perdoados e aceitos; então, fazer as coisas que agradam a Cristo é o elevado e celestial chamado do cristão. "Para conhecê-lo, e à virtude da sua ressurreição, e à comunicação de suas aflições, sendo feito conforme à sua morte... Irmãos, quanto a mim, não julgo que o haja alcançado; mas uma coisa faço, e é que, esquecendo-me das coisas que atrás ficam, e avançando para as que estão diante de mim, prossigo para o alvo, pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus" (Filipenses 3:10-14). Tal era, e deveria sempre ter sido, o espírito e o anelo do cristianismo. Mas o que encontramos ao final do sexto século? Qual era a "uma coisa" que Gregório tinham em vista? Claramente não eram as reivindicações de um Cristo celestial, e conformidade com Ele em Sua ressurreição, sofrimentos e morte. Podemos seguramente afirmar que o grande objetivo de sua vida pública foi estabelecer além de qualquer disputa o bispado universal de Roma. E para este fim, em vez de levar almas a deliciarem-se nos caminhos de Cristo, assim como nEle Próprio, o que Paulo sempre fez, ele buscava fazer avançar suas reivindicações da Sé Romana pela idolatria e corrupção. Nem mesmo o espírito de perseguição estava totalmente ausente.

O monasticismo, sob o patrocínio de Gregório, especialmente de acordo com as regras mais estritas de Bento, foi grandemente revivido e amplamente estendido. A doutrina do purgatório, respeito por relíquias, a adoração de imagens, a idolatria dos santos e dos mártires, o mérito das peregrinações a lugares santos, foram todos ensinados ou sancionados por Gregório, como coisas conectadas ao seu sistema eclesiástico. E temos de reconhecer que tudo isso são características inegáveis da atividade de Balaão e da corrupção de Jezabel.

Mas agora passemos ao século VII. A Idade das Trevas está próxima, e tenebrosa de fato ela é. O papado começa a assumir uma forma definida. E, como chegamos em nossa história ao final de uma era do cristianismo e ao começo de outra, podemos fazer uma pausa proveitosa por um momento para fazer um levantamento geral do progresso do evangelho em diferentes países.

Reflexões sobre a Missão de Agostinho e o Caráter de Gregório

Agostinho [de Cantuária] é mencionado por alguns historiadores como um cristão devoto, e seu empreendimento missionário como um dos maiores nos anais da igreja. Mas, sem querer diminuir um degrau sequer da grandeza do homem ou de sua missão, não podemos nos esquecer que as Escrituras são o único padrão verdadeiro de caráter e obras. Ali aprendemos que o fruto do Espírito é "amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança" (Gálatas 5:22). E, certamente, o grande clérigo não manifestou para com seus irmãos, os cristãos britânicos, a graça do amor, a paz, ou a conciliação; pelo contrário, ele era orgulhoso, imperioso, soberbo e vanglorioso.

Esses sérios defeitos em seu caráter não eram desconhecidos a Gregório, como ele diz, em uma carta endereçada a ele: "Eu sei que Deus tem realizado, através de você, grandes milagres entre o povo, mas lembremo-nos de que, quando os discípulos disseram com alegria ao divino Mestre: 'Senhor, pelo teu nome, até os demônios se nos sujeitam', Ele lhes respondeu: 'Alegrai-vos antes por estarem os vossos nomes escritos nos céus'*. Enquanto Deus assim emprega sua agência, lembre-se, meu querido irmão, de julgar a si mesmo secretamente por dentro, e conhecer bem o que você é. Se você ofendeu a Deus em palavras ou ações, preserve essas ofensas em seus pensamentos para reprimir a vanglória de seu coração, e considere que o dom de milagres não lhe é concedido por si mesmo, mas para aqueles cuja salvação você está trabalhando para conseguir". Em outra carta ele o alertou contra a "vaidade e pompa pessoal", e lembrou-lhe "que o pálio de sua dignidade devia ser usado no serviço da igreja, e não para ser colocado em competição com o púrpura real nas ocasiões estatais".

{* Lucas 10:17-20.}

Agostinho era totalmente inadequado para uma missão que requeria paciência e uma terna consideração pelos outros. A igreja britânica tinha existido por séculos, seus bispos tinham tomado parte em grandes concílios eclesiásticos e assinado seus decretos. Os nomes de Londres, York e Lincoln são encontrados nos registros do Concílio de Arles (314 d.C.), de modo que devemos, no mínimo, respeitar nos britânicos o desejo deles de aderirem à liturgia transmitida pelos seus ancestrais, e de resistir à suposição estrangeira da supremacia espiritual de Roma. Agostinho falhou completamente em se aproveitar das lições de humildade que tinha recebido de seu grande mestre, e assim tem menos motivo de reivindicação sobre nossa estima e admiração.

O grande clérigo Gregório, assim como seu grande missionário, não sobreviveu muito tempo após a conquista espiritual da Inglaterra. Desgastado por seus grandes labores e enfermidades, ele morreu no ano 604, assegurando a seus amigos que a expectativa da morte era seu único consolo, e pedindo-lhes que orassem por sua libertação dos sofrimentos corporais.

A conduta de Gregório durante os treze anos e seis meses em que foi bispo de Roma demonstra um zelo e uma sinceridade dificilmente igualada na história da igreja romana. Ele era laborioso e abnegado no que ele acreditava ser o serviço de Deus, e em seu dever para com a igreja e para com toda a humanidade. A coleção de suas cartas, quase 850 em seu número, carrega um amplo testemunho de sua capacidade e atividade em todos os assuntos dos homens, e em todas as esferas da vida. "De tratar com reis patriarcas ou imperadores sobre as mais elevadas preocupações da Igreja e do Estado, ele passava a dirigir o gerenciamento de uma fazenda, ou ao alívio de algum aflito peticionário em alguma dependência distante de sua Sé. Ele aparece como um papa, como um soberano, como um bispo, como senhorio. Ele toma medidas para a defesa de seu país, para a conversão dos pagãos, para a repreensão e reconciliação dos cismáticos", etc.*

{* J.C. Robertson, vol. 2, p. 4.}

Mas, não obstante as variadas excelências de Gregório, ele era profundamente infectado com os princípios e o espírito da época em que vivia. O espírito de Jezabel estava evidentemente trabalhando ainda em sua juventude. Em vão procuramos por qualquer coisa parecida com a simplicidade cristã na igreja de Deus dessa época. Não podemos duvidar da piedade do próprio Gregório; mas, como um eclesiástico, o que ele era? Envenenado até o fundo do coração pela grosseira ilusão das reivindicações universais da cadeira de São Pedro, ele não podia arriscar nenhum rival, como vemos em sua oposição determinada e amarga às pretensões de João, bispo de Constantinopla; e, o que era ainda mais tenebroso, vemos o mesmo espírito em sua exultação ao saber sobre o assassinato do imperador Maurício e sua família pelo cruel e traiçoeiro Flávio Focas, simplesmente porque Gregório presumiu que Maurício fosse culpado do que ele considerou heresia. Ao que parece, Maurício apoiou o que Gregório julgou ser usurpação da parte de João, ao assumir o título de bispo universal. Mas mesmo sancionar tal afirmação não era qualquer pequeno crime na mente do pontífice romano. E assim foi com Gregório. Quando a notícia da sangrenta tragédia chegou a seus ouvidos, ele se alegrou; pareceu a ele ser uma luz de dispensação providencial para a libertação da igreja de seus inimigos. As própria fontes de caridade parecem ter secado nos corações de todos os que já se sentaram em um trono papal, quando se tratava de rivais eclesiásticos. A justiça, a franqueza, a humanidade, e todo sentimento correto do cristianismo acabam cedendo às dominantes reivindicações da falsa igreja. Até mesmo Gregório se curvou e foi terrivelmente corrompido pela "mulher Jezabel" (Apocalipse 2:20).

A Hierarquia Católica Romana Formada na Inglaterra

Gregório, ao ouvir sobre o grande sucesso de Agostinho, enviou-lhe mais missionários, que carregaram com eles um número de livros, incluindo os Evangelhos, utensílios cerimoniais, vestimentas, relíquias, e o pálio que deveria investir Agostinho como Arcebispo da Cantuária. Ele também orientou-lhe que consagrasse doze bispos em sua província; e, caso achasse vantajoso para a propagação da fé, que estabelecesse outro metropolita em York, que deveria então ter autoridade de nominar outros doze bispos para os distritos nortenhos da ilha. Tais foram os rudimentos da igreja inglesa; e tal era a exagerada impaciência de Gregório pela supremacia eclesiástica, que ele estabelecia um plano de governo para locais antes de terem sido visitados pelos evangelistas.

"Na visão eclesiástica do caso", diz Greenwood, "a igreja anglo-saxônica era a filha genuína de Roma. Mas, além dos limites desse estabelecimento, nenhum direito de parentesco pode ser atribuído a ela dentro das ilhas britânicas. Uma numerosa população cristã ainda existia nos distritos nortenhos e ocidentais, cujas tradições não davam apoio à alegação romana de maternidade. O ritual e disciplina das igrejas britânicas, galesas e irlandesas diferiam em muitos pontos daquelas de Roma e dos latinos em geral. Eles celebravam a festa da Páscoa em conformidade com a prática das igrejas orientais, e na forma de tonsura*, assim como no rito batismal, ele seguiam o mesmo modelo: diferenças que, por si só, parecem suficientes para excluir toda a probabilidade de um pedigree puramente latino".**

{* N. do T.: Corte circular, rente, do cabelo, na parte mais alta e posterior da cabeça, que se faz nos clérigos; cercilho, coroa. Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira.}

{** Cathedra Petri, livro 3, p. 215.}


Agostinho, então à frente da hierarquia composta de doze bispos, imediatamente fez a ousada tentativa de trazer a antiga igreja britânica sob a jurisdição romana. Através da influência de Etelberto ele obteve uma conferência com alguns dos bispos britânicos em um lugar que, naquela época, foi chamado de "carvalho de Agostinho", em Severn. Ali o clero romano e o britânico se encontraram pela primeira vez; e a primeira e imperiosa exigência de Agostinho foi: "Reconheçam a autoridade do bispo de Roma". "Desejamos amar todos os homens", eles humildemente responderam, "e qualquer coisa que fizermos por vocês, faremos também a este a quem chamam de Papa". Surpresos e indignados com sua recusa, Agostinho os exortou a adotarem os costumes romanos quanto à celebração da Páscoa, à tonsura e à administração do batismo, para que uma uniformidade de disciplina e adoração pudesse ser estabelecida na ilha. A isto eles positivamente se recusaram. Tendo recebido o cristianismo, primeiramente, não de Roma, mas do Oriente, e nunca tendo reconhecido a igreja romana como sua mãe, eles viam-se como independentes da Sé de Roma. Um segundo e um terceiro concílio foi realizado, mas sem melhores resultados. A Agostinho foi claramente dito que a igreja britânica não reconheceria homem algum como supremo na vinha do Senhor. O arcebispo exigiu, argumentou, censurou, realizou milagres; mas tudo sem efeito -- os britânicos eram firmes. Por fim, lhe disseram que eles não podiam se submeter nem à soberba dos romanos, nem à tirania dos saxões. Despertado à irada indignação pela quieta firmeza deles, o zangado sacerdote exclamou: "Se vocês não receberem os irmãos que lhes trazem paz, vocês receberão inimigos que lhes trarão guerra. Se vocês não se unirem conosco para mostrar aos saxões o caminho da vida, vocês receberão deles o golpe da morte". O arrogante arcebispo retirou-se, e supõe-se que tenha morrido pouco tempo depois, em 605 d.C., mas sua profecia de mal agouro cumpriu-se logo após sua morte.

Edelfrido
, um dos reis anglo-saxões, ainda um pagão, juntou um numeroso exército e avançou em direção a Bangor, o centro do cristianismo britânico. Os monges fugiram em grande alarme. Cerca de 1250 deles se refugiaram em um local afastado, onde concordaram em continuar juntos em oração e jejum. Edelfrido se aproximou e, ao ver um número de homens desarmados, perguntou quem eram. Ao dizerem-lhe que eram os monges de Bangor que tinham vindo a orar pelo sucesso de seus conterrâneos: "Então", ele clamou, "embora não tenham armas, estão lutando contra nós"; e ordenou a seus soldados que caíssem sobre os monges em oração. Cerca de 1200, conta-se, foram mortos, e apenas cinquenta escaparam em fuga. Assim o domínio de Roma começou na Inglaterra, o que continuou por quase mil anos.

Se Agostinho tinha realmente algo a ver com o assassinato dos monges, parece difícil dizer. Aqueles que tomam uma forte visão protestante do caso afirmam claramente que seus últimos dias foram ocupados em fazer arranjos para o cumprimento de sua própria ameaça. Outros, que tomam uma visão oposta, negam que haja qualquer evidência de que ele influenciou os pagãos para a terrível tragédia. Mas, seja como for, uma suspeita tenebrosa deve sempre pairar sobre a política de Roma. As próprias palavras vingativas de Agostinho, e toda sua história, confirmam a suspeita. Tal era a natureza da intolerante Jezabel -- quando o argumento falhava, ela apelava para a espada. A partir de então o romanismo caracterizou-se pela arrogância e sangue. A antiga igreja da Britânia, que era limitada aos distritos montanhosos do País de Gales, gradualmente diminuiu e desapareceu.*

{* Gardner, vol. 1, p. 391.}

A Missão de Agostinho na Inglaterra

No ano 596, e cerca de 150 anos após a chegada dos saxões na Britânia, a famosa missão de Gregório saiu da Itália rumo a essa ilha. Uma companhia de quarenta monges missionários, sob a direção de Agostinho, foram enviados para pregar o evangelho aos ignorantes anglo-saxões. Mas ao ouvir sobre o caráter e hábitos selvagens do povo, e sendo ignorantes de sua língua, eles ficaram seriamente desencorajados e tiveram medo de prosseguir. Agostinho foi enviado de volta pelos outros para suplicar a Gregório que os dispensassem do serviço. Mas ele não era um homem que abandonava uma missão daquele tipo. Ele não a planejou com pressa, mas foi o resultado de muita oração e deliberação. Ele, portanto, os exortou e encorajou a seguir em frente, confiando no Deus vivo e na esperança de ver o fruto de seus labores na eternidade. Ele entregou-lhes cartas de apresentação para bispos e príncipes, e lhes garantiu toda assistência em seu poder. Assim animados eles prosseguiram a sua viagem e, viajando pelo caminho da França, chegaram na Britânia.

Os 41 missionários, tendo desembarcado na Ilha de Thanet, anunciaram a Etelberto, rei de Kent, sua chegada de Roma e sua missão com novas de grande alegria para ele e para seu povo. As circunstâncias favoreceram muito essa marcante missão. Bertha, a rainha (filha de Clotário I, rei dos francos), era cristã. Seu pai estipulou em seu acordo matrimonial que devia ser permitido a ela a livre profissão do cristianismo, na qual tinha sido educada. Um bispo participava de sua corte, e vários de sua casa eram cristãos, e as cerimônias eram conduzidas de acordo com a forma romana. O Senhor, neste caso, usou uma mulher, como Ele fez muitas vezes, para a propagação do evangelho entre os pagãos. Estas contrastam favoravelmente com a classe de "mulheres Jezabel", e preservam a linha prateada da graça de Deus nessas tempos de trevas. Bertha era da casa de Clóvis e Clotilda.

Etelberto, influenciado por sua rainha, recebeu bondosamente os missionários. Foi permitido a Agostinho e seu séquito que prosseguissem para a Cantuária, a residência do rei. Este consentiu com uma entrevista, mas ao ar livre por medo de magia. Os monges se aproximaram da festa real de maneira muito imponente. Um deles, carregando uma grande cruz prateada com a figura do Salvador, conduziu a procissão, a qual seguiram-se os demais, cantando seus hinos em Latim. Ao chegarem ao carvalho escolhido como o local da conferência, foi dada permissão para que pregassem o evangelho ao príncipe e seus assistentes. O rei foi então informado que eles tinham vindo com boas novas, e até mesmo vida eterna para aqueles que os recebessem, e o prazer da bem-aventurança no céu para sempre. O rei ficou favoravelmente impressionado, e lhes deu uma mansão na cidade real de Cantuária, e liberdade para pregarem o evangelho a sua corte e ao povo. Eles então marcharam para a cidade, cantando em uníssono a ladainha: "Te suplicamos, ó Senhor, em toda a Tua misericórdia, que Tua ira e Tua fúria sejam removidas desta cidade, e de Tua santa casa, porque nós temos pecado. Aleluia".

Por esses passos preparatórios o caminho dos missionários tornou-se simples e fácil. A aprovação do monarca inspirou seus súditos com confiança, e abriu seus corações aos mestres. Novos convertidos se multiplicaram rapidamente. No Natal do ano 597 conta-se que não menos que 10.000 pagãos foram reunidos ao rol da igreja católica pelo batismo. Etelberto também se submeteu ao batismo e ao cristianismo na forma romana, tornando-se a religião estabelecida de seu reino. Esta foi a primeira base de Roma na Inglaterra. Ela estava agora determinada em subjugar a igreja britânica ao papado, e estabelecer sua autoridade na Grã-Bretanha, como tinha feito na França. Ela começou a trabalhar da seguinte maneira... (continua no próximo capítulo)

A Chegada dos Saxões à Inglaterra

Por volta da metade do século V os navios saxões chegaram à costa britânica e, sob seus líderes, Hengist e Horsa, desembarcaram algumas centenas de guerreiros ferozes e desesperados. Estes famosos líderes imediatamente tomaram o campo a frente de seus seguidores e derrotaram completamente os pictos e escotos. Mas o remédio se provou pior do que a doença. Um grande mal foi afastado, mas um outro pior apareceu. Os saxões, vendo que o país que eles tinham sido contratados a defender possuía um clima mais agradável que o próprio país deles, e ansiosos por trocar as sombrias margens do Norte pelos campos ricos da Britânia, convidaram novas levas de seus compatriotas para unirem-se a eles; e assim, de defensores eles se tornaram conquistadores e mestres dos malfadados britânicos. Os anglos e outras tribos se espalharam pelo país; e embora os britânicos não tivessem cedido sem uma luta severa, o poder saxão prevaleceu e reduziu os nativos à completa submissão, ou levou-os a procurar abrigo nas montanhas do País de Gales, na Cornualha e em Cumberland. Muitos emigraram, e alguns se estabeleceram em Armórica, agora Bretanha, no noroeste da França.

Mas os saxões e anglos não eram apenas guerreiros selvagens, eles eram também pagãos selvagens e impiedosos. Eles exterminavam o cristianismo onde quer que conquistavam. De acordo com o "venerável Beda", os bispos e seu povo foram indiscriminadamente abatidos com fogo e espada, e não havia ninguém para enterrar as vítimas de tal crueldade. Edifícios públicos e privados foram, do mesmo modo, destruídos, sacerdotes foram assassinados por toda a parte no altar; alguns que tinham fugido para as montanhas foram apreendidos e mortos aos montes, outros, cansados e com fome, renderam-se, abraçando a escravidão perpétua em troca da vida; alguns fugiram a regiões além do mar, e alguns levaram uma vida de pobreza entre as montanhas, florestas e rochedos.

A Britânia, após esse evento, recaída a um estado de obscuro barbarismo, foi retirada da visão do mundo civilizado e afundou-se às profundezas da miséria e crueldade; e ainda assim esse é o mesmo povo que o Senhor pôs no coração de Gregório para ganhá-lo para Si pelo evangelho da paz. Como podiam alguns pobres monges, sem frota ou exército, como podemos bem exclamar, se aventurar em tais margens, e menos ainda ganhar os corações e subjugar a vida de tais selvagens à fé e prática do evangelho da paz? É o mesmo evangelho que triunfou sobre o judaísmo, o orientalismo, o paganismo, e pelo mesmo poder divino, em breve triunfaria sobre o feroz barbarismo dos anglo-saxões. Quão fraca e tola é a infidelidade que questiona sua origem divina, poder e destino! Observaremos agora o progresso da missão.

A Antiga Igreja Britânica

Embora a igreja britânica tivesse adquirido tal crédito pela ortodoxia, temos muito pouca informação confiável quanto à sua ascensão e progresso, ou quanto aos meios pelos quais isto foi efetuado. Há muitas tradições, mas elas mal são dignas de serem repetidas, e são impróprias para uma breve história. Há ampla evidência, no entanto, de que na primeira parte do século IV, e pelo menos por duzentos anos antes da chegada dos monges italianos, a igreja britânica tinha uma organização completa, com seus próprios bispos e metropolitas.

De acordo com o testemunho tanto dos historiadores antigos quanto dos modernos, as doutrinas e rituais da igreja antiga da Britânia eram de caráter muito simples se comparadas com a grega e romana, embora ainda muito longe da simplicidade do Novo Tetamento. Eles ensinavam a unicidade da Divindade, a Trindade, a natureza divina e humana de Cristo, a redenção por Sua morte, e a eternidade de recompensas e punições futuras. Eles consideravam a ceia do Senhor como um símbolo, e não um milagre; eles tomavam o pão e o vinho como nosso Senhor comandou que fossem tomados -- em memória dEle -- e eles não recusavam o vinho aos leigos. Sua hierarquia consistia de bispos e sacerdotes, com outros ministros, e uma cerimônia especial era feita para a ordenação. O casamento era comum entre o clero. Havia também monastérios com monges vivendo neles, jurados à pobreza, castidade e obediência a seu abade. As "igrejas"* eram construídas em honra aos mártires, e cada "igreja" tinha muitos altares; as cerimônias eram realizadas na língua latina, em tom monocórdico pelos sacerdotes. Disputas eram finalmente resolvidas por sínodos provinciais, que ocorriam duas vezes ao ano; acima disso, em questão de disciplina, não havia apelação. Assim vemos que as doutrinas da igreja antiga da Britânia era caracterizada por uma verdadeira simplicidade apostólica, e como instituição ela era livre e sem restrições.**

{* Aqui no sentido de construção, ou templo cristão}

{* Ver Monasticismo Inglês, por Travers Hill, p. 141, as obras de Gildas; A História Eclesiástica da Nação Inglesa, por Beda; A História Eclesiástica da Grã-Bretanha, por Jeremy Collier, vol. 1.}

É motivo de sincera gratidão* que a história inicial da igreja na Inglaterra tenha deixado um nome tão íntegro comparado às superstições e corrupções do Oriente e do Ocidente. Mas, infelizmente, sua existência como um estabelecimento separado não durou muito. Ela mal pôde sobreviver à metade do século VII. Suas calamidades foram provocadas por três passos consecutivos, todos estes fora de sua própria jurisdição -- a retirada das tropas romanas da Britânia; a Conquista Saxônica; e a Missão Agostiniana. Vamos agora olhar brevemente para cada um desses passos e seus efeitos.

{* O autor vivia na Inglaterra. }

Vimos algo sobre o declínio e aproximação da queda do Império Romano. Em consequência das pesadas calamidades que caíram sobre a cidade e as províncias de Roma, as tropas foram gradualmente retiradas da ilha britânica para que protegessem o centro do domínio. E os romanos, vendo que não podiam mais dispensar as forças necessárias para um estabelecimento militar na Britânia, partiram finalmente da ilha por volta da metade do século V, cerca de 475 anos após Júlio César ter desembarcado, pela primeira vez, em suas margens. O governo então caiu nas mãos de um número de príncipes insignificantes que, é claro, brigaram entre si. Guerras civis, fraqueza nacional e desmoralização logo se seguiram, com seus habituais juízos.

A retirada das tropas romanas necessariamente expôs o país a invasores, especialmente os pictos e escotos. Os chefes britânicos, incapazes de resistir a esses audaciosos ladrões e saqueadores, apelaram, em sua angústia, a Roma. "Os bárbaros", eles diziam, "atravessaram nossas muralhas como lobos em um rebanho de ovelhas, vão embora com seus espólios e retornam todos os anos." Mas por mais que os romanos pudessem ter pena de seus velhos amigos, eles agora não podiam ajudá-los. Decepcionados com a ajuda de Roma, e desesperado por sua incapacidade de defenderem-se contra as desoladoras tribos do Norte, os britânicos se voltaram aos saxões por ajuda.*

{* Enciclopédia Britânica, vol. 5, p. 301.}

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